domingo, 12 de abril de 2009

DOSSIÊ DA INCLUSÃO – Leila Wasum



Minha Experiência Pessoal:

Nasci em 1962 e quando eu tinha um ano e quatro meses minha mãe deu à luz minha irmã caçula. Com um parto muito difícil, faltou oxigenação ao cérebro de minha irmã e a Denise tinha um problema mental, o que os médicos diziam ser um pequeno retardamento. Como ela era muito comunicativa e expansiva, todos perguntavam se era eu quem era a criança “excepcional”, pois sempre fui tímida e retraída.
Desde muito cedo tive que aprender que ela necessitava de mais cuidados do que eu, que não poderia fazer algumas coisas que me eram exigidas. Foi muito difícil, tinha ciúmes de ela estar sempre grudada na minha mãe, não entendia porque eu tinha que ajudar nas tarefas domésticas mais do que ela. Quando ela entrou na escola, também foi difícil entender que ela não teria o mesmo desenvolvimento e as mesmas exigências que eu e meus irmãos.
Meus pais sempre foram muito conscientes e participativos e logo entenderam e aceitaram que ela precisa de cuidados especiais e que não tinha o mesmo ritmo de amadurecimento que nós. Mesmo enfrentando muitos preconceitos colocaram a Denise na APAE e na Escola Especial com a finalidade de ajudá-la e tentar fazer com que se sentisse mais “incluída”. Aprendi a conviver com aquelas crianças, pois sempre levava e buscava a Denise e frequentava as atividades que envolvessem a família. No entanto, sempre era doloroso aceitar aquela situação, pensar que minha irmã teria dificuldades para se desenvolver e ser aceita na sociedade.
Aos doze anos a Denise começou a apresentar sintomas de uma doença degenerativa congênita na medula nervosa que atingia a coordenação motora e os músculos. Foi um período de muita dor, muitas incertezas, aos poucos ela começou a perder os movimentos das pernas e a coordenação dos braços. Só aos dezesseis anos é que foi realmente comprovada esta doença, segundo os médicos uma síndrome conhecida na Alemanha, de onde vieram nossos antepassados. Ela passou muitos anos na cama ou na cadeira de roda e nossa casa teve que sofrer adaptações para termos mobilidade com ela.
Paralelo a tudo isto entrei no Curso Normal com quinze anos e surgiu a oportunidade de fazer um curso de Voluntária para trabalhar na APAE, pensei que era o momento de entender e resgatar alguns valores que me tinham escapado, que talvez pudesse entender e aceitar toda a situação que vivíamos em casa. Após o curso e seu estágio, que terminou no fim de outubro, eu e duas colegas começamos a trabalhar teatro e música com os adolescentes da APAE. Foi muito gratificante e eles conseguiram decorar suas falas para o teatro que fizemos para a festa de Natal. No ano seguinte trabalhei como auxiliar da professora de uma turma com crianças com síndrome de Daw e uma autista, uma vez por semana. Foi um trabalho muito difícil, principalmente quando a professora faltava e eu tinha que assumir a turma. Eles eram muito inquietos e eu sempre ia para casa com algum machucado. Trabalhei todo o ano de 1978 com esta turma e depois parei de trabalhar na APAE porque tinha aula o dia todo. Sem dúvida, a experiência vivida nesta escola marcou muito minha vida, não só como professora, mas me ajudou a ser mais tolerante e carinhosa com minha irmã.
Já como professora formada fui trabalhar com alfabetização e sempre obtinha resultados satisfatórios com alunos considerados problemáticos. Por isto me tornei professora da “classe especial” da escola, com crianças com alto nível de repetência na 1ª série. Aprendi muito com eles e nas reuniões de classes especiais de todo município, com troca de experiências e relatos das colegas. Dos oito alunos consegui alfabetizar quatro, o que me deixou muito feliz.
Talvez por toda esta bagagem que eu trago, vivendo uma experiência pessoal tão profunda, é que sempre consegui bons resultados com alunos com necessidades especiais, principalmente no que diz respeito ao seu entrosamento, participação e colaboração com a turma. Também entendo muito crianças que tenham irmãos com necessidades especiais porque me coloco no lugar delas e sei o que elas sentem e o quão é difícil entender que uma pessoa da nossa família, com características parecidas com as nossas possam ser tão diferentes e precisem de nosso amor e nosso apoio.
Fazem dois anos que a Denise faleceu, mas nossa vida sempre esteve voltada para cuidá-la e fazer com que seus dias fossem os mais confortáveis e cheios de amor possíveis. Meus filhos cresceram sabendo que ela era uma pessoa que precisava de cuidados especiais, que competia e brincava com eles como se fosse da mesma idade Talvez a maior lição que ela deixou a toda família foi a união necessária nos momentos. difíceis, a alegria constante que ela tinha, a necessidade de aceitarmos o diferente e convivermos com bom humor, esperança e fé.

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